Deus sai de cena
Fundamentalistas ainda resistem à Evolução, que há 150 anos separou fé e ciência
Não há questionamentos, por exemplo, sobre as teorias da relatividade, do Big Bang ou da mecânica quântica. Mas a idéia de Charles Darwin de que o homem é diretamente ligado aos outros animais e descende de um ancestral comum ao dos macacos é freqüentemente rejeitada, seja na forma do criacionismo mais tradicional ou do seu primo pseudocientífico mais recente, o design inteligente.
Como afirmou o professor de genética Steve Jones, da University College, de Londres, ao jornal “The Guardian”: “Quando eu pergunto (a alunos que questionam Darwin) se eles acreditam nas leis da hereditariedade de Mendel, eles respondem que sim, claro. E na existência do DNA? De novo, sim. E nas mutações genéticas? Sim. Na disseminação da resistência a inseticidas? Sim. Na divergência de populações isoladas em ilhas? Sim. E vocês aceitam que 98% do DNA de humanos e chimpanzés é comum? Sim. Então, o que há de errado com a seleção natural? É uma mentira, eles respondem. É simplesmente incrível.” — Até o século XIX, a teologia oferecia respostas para fenômenos naturais válidas até mesmo para a comunidade científica — resume a bióloga Maria Isabel Landim, da USP, uma das curadoras da exposição de Darwin no Brasil. — Quando a Teoria da Evolução bane de vez a necessidade do sobrenatural para explicar o mundo natural, de fato ocorre uma perda de poder muito grande por parte das religiões e acho que esse é o medo.
Além disso, continua a especialista, a questão se estende para o campo da moral.
— Uma das idéias das religiões é ser o bastião da moral e dos bons costumes — resume a bióloga. — E quando a Teoria da Evolução mostra que a moral é também um resultado de leis naturais, que para viver em sociedade precisamos ter certas regras, isso representa uma ameaça muito grande ao poder das religiões.
O criacionismo mais tradicional sempre questionou a Teoria da Evolução, mas ao se travestir de design inteligente a partir da década de 90, tornou-se ainda mais pernicioso por se definir como uma tese científica de peso equivalente à de Darwin e tentar refutar o evolucionismo.
— Sempre existiram pessoas insatisfeitas com a visão fornecida pela evolução, mas nos últimos 20 anos os movimentos criacionistas ganharam um vulto maior — afirma o biólogo Cristiano Moreira, também curador da exposição de Darwin no Brasil. — O que antigamente era apenas um argumento filosófico, hoje é um argumento mascarado de científico. E o que é pior: que tenta estender essa influência a áreas da ciência, sobretudo no ensino.
Para se equiparar à Teoria da Evolução, o design inteligente (que defende a idéia de que Deus seria o grande projetista do Universo) usa como um de seus principais argumentos a idéia falaciosa de que o evolucionismo “é apenas mais uma teoria”, sem comprovação científica. Ocorre que teoria, no linguajar científico, tem um significado diferente daquele do uso cotidiano: é aquela que passou por todos os testes possíveis e foi corroborada.
— Fato, em ciência, é aquilo que observamos, como a chuva, o pulo de um peixe — explica Moreira. — Em cima dos fatos, desenvolvemos hipóteses sobre por que choveu ou por que o animal pulou. A partir dessas hipóteses, elaboramos testes para corroborar e também para refutar as idéias.
Vale ressaltar que o que, em tese, não pode ser refutado não pode ser considerado uma questão científica. É por isso que Deus não pode ser colocado em teste cientificamente (tampouco o design inteligente).
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