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Rio de Janeiro, RJ, Brazil
Cláudia Andréa Prata Ferreira é Professora Titular de Literaturas Hebraica e Judaica e Cultura Judaica - do Setor de Língua e Literatura Hebraicas do Departamento de Letras Orientais e Eslavas da Faculdade de Letras da UFRJ.

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segunda-feira, 30 de junho de 2008

Opinião - O espírito chega antes do missionário

Leonardo Boof, Teólogo
Jornal do Brasil, Opinião, página 9, em 30/06/2008.

Um dos efeitos do processo de mundialização – que vai muito além de sua expressão econômico-financeira – é o encontro com todo tipo de tradições espirituais e religiosas. Instaurou-se um verdadeiro mercado de bens simbólicos no qual os vários caminhos, doutrinas, cerimoniais, ritos e esoterismos são oferecidos para atender à demanda de um número crescente de pessoas, geralmente, fatigadas pelo excesso de materialimso, racionalismo, consumismo e superficialismo de nossa cultura convencional.

Por detrás deste fenômeno há uma busca humana a ser entendida e também a ser atendida. O espiritual e o místico, à revelia das predições dos mestres da suspeita como Marx, Freud e Nietzsche, estão voltando com renovado vigor. Eles revelam uma dimensão esquecida do ser humano, vista pelos modernos, mais como expressão de patologia do que de sanidade. Hoje, entre os estudiosos das ciências da religião, ela está resgatando sua cidadania. Tem seu assento na razão sensível e cordial que não substitui mas completa a razão científico-calculatória. Nela se elaboram os grandes sonhos e surgem as estrelas-guias que dão rumo à nossa vida. A religião desvela o ser humano como projeto infinito e lhe brinda o objeto adequado que o faz descansar: o infinito.

Os cristãos têm especial dificuldade no diálogo com as religiões. Sustentam a crença de que são portadores de uma revelação única e de um salvador universal, Jesus Cristo, o filho de Deus encarnado. Em alguns, esta crença ganha foros de fundamentalismo, dizendo, sem atalhos, que fora do cristianismo não há salvação, repetindo uma versão de cariz medieval. Outros, a partir da própria Bíblia e de uma reflexão teológica mais profunda, sustentam que todos os seres humanos, também o cosmos, estão permanentemente sob o arco-íris da graça de Deus. Para os primeiros 11 capítulos do Gênesis, nos quais não se fala ainda em Israel, como "povo eleito", todos os povos da Terra, são povos de Deus. Isso permanece válido até os tempos atuais.

Ademais, dizem as Escrituras que o espírito enche a face da Terra, perpassa a história, anima as pessoas a praticarem o bem, a viverem na verdade e a realizarem a justiça e o amor. O espírito chega antes do missionário. Este, antes de anunciar sua mensagem, precisa reconhecer as obras que este espírito fez no mundo e prolongá-las.

O Cristo não pode ser reduzido ao espaço palestinense. Ao assumir o homem Jesus de Nazaré, o filho se inseriu no processo da evolução, tocou a realidade humana e ganhou uma dimensão cósmica. Coube ao teólogo franciscano Duns Scotus na Idade Média e a Teilhard de Chardin nos tempos modernos apontar que o filho está presente na matéria e nas energias originarias e que foi densificando sua presença na medida em que se realizava a complexidade e crescia a consciência até irromper na forma de Jesus de Nazaré. Esta individuação não diminui seu caráter divino e cósmico, de forma que pode irromper, sob outros nomes e sob outras figuras que revelam em suas vidas e obras a cercania do mistério de Deus. Para evitar certa "cristianização"do tema, podemos falar, como o fazem grandes tradições, da sabedoria/sofia. Ela está presente na criação, na vida dos povos e especialmente nas lições dos mestres e sábios. Ou se usa também a categoria logos ou verbo que revela o momento de inteligibilidade e ordenação do universo. Ele não fica uma energia impessoal mas revela suma subjetividade e suprema consciência.

Estas visões ancoram nossa vida num sentido bom que nos permite suportar os avatares desta cansada existência.

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