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Rio de Janeiro, RJ, Brazil
Cláudia Andréa Prata Ferreira é Professora Titular de Literaturas Hebraica e Judaica e Cultura Judaica - do Setor de Língua e Literatura Hebraicas do Departamento de Letras Orientais e Eslavas da Faculdade de Letras da UFRJ.

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domingo, 13 de abril de 2008

Deus não faz política (Alfredo Sirkis)

Deus não faz política

Alfredo Sirkis

A vida e a história nos levam por caminhos (e descaminhos) muitas vezes inimagináveis. Quem diria que em pleno século 21, nas eleições para a cidade mais cosmopolita do Brasil, voltaríamos à antiga polarização entre o laico e o confessional, entre a idéia de que a religião deva estar longe das lides políticas e a de que Deus faz política, toma partido e possui candidatos. Essa situação está muito longe de ser rara no mundo contemporâneo, onde os fundamentalismos religiosos estão em alta. O islâmico, naturalmente; o da direita cristã, que contribuiu para as duas vitórias de George W Bush; o judaico, que bloqueia a devolução da Cisjordânia e da parte palestina de Jerusalém e inviabiliza a paz; o hinduísta, que guerreia o islâmico, e por aí vai. O Brasil, que tem tantos problemas, há muito tempo não tinha esse. Graças a Deus. Agora, corre o risco de voltar a ter.

Há dias, tive um diálogo civilizado com uma eleitora de classe média do bispo que me abordou para manifestar sua fé na vitória de seu candidato. Trocamos opiniões, contei-lhe minha experiência negativa com vários políticos pentecostais que conheci alinhados às piores práticas do parlamento e da administração pública. Ela não negou as evidências, referiu-se a eles como "ovelhas negras" que existem em qualquer rebanho. O diálogo seguiu cordial conquanto hermético. No final, com seus olhos brilhando, ela evocou o objetivo final: "Um Brasil sob o reino de Deus". Me levou a refletir: se de fato Crivella vencer as eleições no Rio, qual seria a próximo lance? O bispo Macedo postulando a sucessão de Lula? A posição laica que está na essência do nosso ordenamento constitucional, da qual a maioria dos brasileiros distraidamente comungamos, não exclui a importância da espiritualidade e da religiosidade. Pessoalmente, estou convicto que não há um caminho único para Deus e que ele pode se dar por diversos credos, desde que pelo viés do amor. Acredito que é possível encontrar Deus numa igreja, num tempo evangélico, numa sinagoga, numa mesquita, num pagode budista, num terreiro, dentro de cada um de nós, ou simplesmente não encontrá-lo em nenhum destes lugares por falta de amor.

As convicções religiosas tendem a ser absolutas, enquanto a política pertence ao relativo, ao possível, aos equilíbrios mutantes. Gente de fé religiosa participando da política pode contribuir para seu enriquecimento. Já buscar na política um caminho de poder direto ou indireto para uma instituição religiosa em específico, inclusive com uma carga imensa de interesses materiais é perigo à vista. O que significa, de fato, "um Brasil sob o reino de Deus"? Significa uma nação que exclua os apontados como "não de Deus"? E quem, na Terra, tem autoridade para definir os ungidos ou os enjeitados? Não é à toa que nossa república, no que pese seus erros e carências históricas, desde cedo definiu um estado laico, separando-o da Igreja Católica ou de qualquer outra. Assim deve permanecer. Amém.

Extraído de:
Jornal do Brasil, em 11 de abril de 2008.
A 16 - JB Cidade - Olhar Carioca - Alfredo Sirkis

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