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Rio de Janeiro, RJ, Brazil
Cláudia Andréa Prata Ferreira é Professora Titular de Literaturas Hebraica e Judaica e Cultura Judaica - do Setor de Língua e Literatura Hebraicas do Departamento de Letras Orientais e Eslavas da Faculdade de Letras da UFRJ.

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quinta-feira, 17 de abril de 2008

Atritos entre Vaticano e muçulmanos enterram projeto de igreja saudita

Dois anos após os comentários de Bento 16 sobre o Islã ter provocado protestos ao redor do mundo, o pontífice está novamente em conflito com os muçulmanos. Desta vez, o atrito entre o Vaticano e os muçulmanos está atrasando a construção daquela que seria a primeira igreja da Arábia Saudita

Alexander Smoltczyk
Em Roma

Um pequeno grupo de proeminentes acadêmicos islâmicos recentemente esteve no aeroporto em Roma, aguardando a pessoa que iria buscá-los. Mas ninguém apareceu. Em vez disso, os acadêmicos tiveram que encontrar seu próprio caminho até o Vaticano, onde foram convidados a participar de um encontro para estabelecimento de um "Fórum Católico-Muçulmano".

Foi provavelmente apenas um deslize por parte do Vaticano. Mas foi outro passo em falso no diálogo entre a Igreja Católica e o mundo islâmico.

Na Páscoa, o papa provocou controvérsia quando batizou pessoalmente o jornalista Magdi Allam, nascido no Cairo. A água batismal, escreveu o jornal pan-árabe "Asharq al-Awsat", foi "como gasolina no fogo" das culturas.

Após a morte em 2006 da jornalista italiana Oriana Fallaci, que era conhecida por suas posições fortemente antiislâmicas, Allam agora é considerado o crítico mais forte do Islã em seu país adotivo, a Itália. "Nós permitimos aos islamitas que assumissem o controle das mesquitas nos países europeus", escreveu Allam. "O Ocidente, com sua postura ingênua, nutriu seu próprio inimigo." Seu próximo livro é intitulado "Vida Longa a Israel".

O batismo foi um deslize ou uma provocação? Dizem que o papa nem mesmo estava ciente de quem estava batizando. Talvez o batismo represente uma tentativa dos monsenhores italianos da cúria de minar o diálogo com o Islã. Esta noção é apoiada pelo fato de Bento estar cada vez mais transferindo sua política externa para seu secretário de Estado, o cardeal Tarcisio Bertone, um italiano.

Mas dada a proeminência de Magdi Allam, também é concebível que o papa quisesse enviar uma mensagem -sem se importar muito com as conseqüências- contra o que percebe como sendo um pacifismo excessivo no diálogo cultural. O Islã apóia a liberdade religiosa? Ora, mas parte desta liberdade é a liberdade de se converter a outra fé.

Ratzinger provocou um alvoroço global durante um discurso em Regensburg, uma cidade no sul da Alemanha, em 2006, quando citou um imperador bizantino do século 14 que disse: "Mostre-me o que Maomé trouxe de novo, e você encontrará coisas apenas malignas e inumanas, como seu comando para disseminação da fé pela espada".

Enquanto isso, Bento 16 confessou que o discurso em Regensburg não foi por acaso. Em uma carta aos estudantes na universidade papal, ele escreveu que seu propósito foi reagir à crença ingênua de algumas pessoas de que o diálogo com o Islã é fácil. Mas ele também escreveu que ficou chocado e completamente surpreso com as reações no mundo islâmico.

O exemplo da Arábia Saudita revela quão difícil este diálogo pode ser.

Em novembro passado, o rei Abdullah da Arábia Saudita, que é tratado como "o servidor das duas mesquitas sagradas" (em Meca e Medina), fez a primeira visita a um papa.

Os dois homens pareceram dar-se bem espiritualmente. O rei Abdullah compartilhava as preocupações de Bento 16 com o declínio dos valores e da família, e com a ascensão do ateísmo. Bento 16, por sua vez, saudou a proposta do monarca saudita de organizar um encontro com o que o rei Abdullah descreveu como sendo "nossos irmãos" de todas as religiões, incluindo os de Israel.

Então o papa apontou ao rei saudita que na Páscoa o Qatar, o vizinho de seu país, agora contava com uma nova igreja dedicada à "sagrada Virgem Maria", o que tornava a Arábia Saudita o único país na Península Árabe sem uma igreja -apesar dos cerca de 1 milhão de cristãos que vivem no país, a maioria imigrantes filipinos. O último padre foi forçado a deixar a Arábia Saudita em 1985. A posse de Bíblias e rosários é uma ofensa quase tão séria ali quanto a posse de heroína.

O rei Abdullah prometeu considerar a permissão da construção de uma igreja no reino. Conversações informais entre o núncio do Vaticano na região, o arcebispo Paul-Mounged El-Hachem, e representantes do governo saudita estavam em andamento desde janeiro.

Mas ao assumir esta posição, Abdullah incorreu na ira dos líderes religiosos de seu próprio país. Um importante imã exigiu recentemente a pena de morte a dois jornalistas que expressaram sentimentos semelhantes aos de seu rei. O grão-mufti do país é absolutamente contrário a convidar rabinos para uma conferência.

"Seria possível lançar negociações oficiais para construção de uma igreja na Arábia Saudita apenas após o papa e todas as igrejas cristãs reconhecerem o Profeta Maomé", disse Anwar Ashiqi, que chefia um instituto de estudos do Oriente Médio na capital saudita, Riad, em uma recente entrevista para rede de televisão por satélite "Al-Arabiya".

Em outras palavras: nós trocaremos com vocês uma igreja pelo reconhecimento do profeta. Isto é que é transcendência.

Os cinco intelectuais esquecidos no aeroporto de Roma fazem parte de um grupo de 138 acadêmicos islâmicos liberais que escreveram uma carta ao papa após seu discurso em Regensburg. Foi a primeira vez que clérigos muçulmanos de diferentes orientações falaram em uma só voz. Não teria feito mal ao Vaticano ter estendido o tapete vermelho para eles.

Especialmente agora que representa uma minoria: o Vaticano foi recentemente forçado a reconhecer que atualmente há mais muçulmanos no mundo do que católicos.

Tradução: George El Khouri Andolfato

Extraído de:
Der Spiegel, em 17/04/2008.

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